Nos antípodas estão os outros, que dizem preferir os cães, que fogem de aglomerados e multidões, mas também de pequenas reuniões e visitas sociais e para os quais sair de casa, receber alguèm ou ter de fazer conversa são sacrifícios hercúleos e, ainda por cima, incompreensíveis.
Pelo meio destas formas de ser extremadas dispersam-se outras, que umas vezes se queixam da pressão e das solicitações a que são sujeitos, dos afazeres e dos compromissos que lhes retiram tempo e disponibilidade, e outras vezes choram amargurados a falta de amigos do peito, a ausência de convites estimulantes, a escassez de pessoas que os compreendam e os aceitem, o afunilamento relacional que a vida provoca e os próprios não conseguem contrariar.
É nesta faixa central, de longe a mais extensa, diferenciada e contraditória, que se produzem os discursos que ouvimos todos os dias e que espelham melhor aquilo que há de mais essencialmente ambivalente nos seres humanos.
Por um lado, queremos pessoas.
Queremos pertencer, ser do grupo, ter pares, reconhecer nos outros coisas nossas e partilhar com eles ideias ou projectos que não nos permitam, em nenhuma circunstância, a sensação de solidão e desamparo.
Por outro lado, queremos que essas pessoas apareçam e desapareçam em função das nossas necessidades e conveniências, que circulem em torno de nós e do nosso mundo, mas não nos invadam nem entrem abruptamente e sem autorização expressa no território que consideramos que é nosso por direito.
Queremos, simultaneamente, um espaço próprio e um espaço comum, sendo dado que o que tiver de ser comum deva ser definido por nós. Isto obviamente na maior das inocências, na mais simpática e crente expectativa de que seja possível um acordo e que outros compreendam e aceitem, sem mágoa nem distanciamento, as condições que propomos ou impomos como as certas e as adequadas. Esquecemo-nos que a proximidade e a distância e as formas de estar, ser e partilhar a vida são tão diferentes qunto as próprias pessoas. Que resultam de uma complexa rede de influências que, ao mesmo tempo que narram o próprio desenvolvimento, afirmam necessidades básicas difíceis de mudar e negociar porque estão inscritas na identidade de cada um.
Os que entendem isto safam-se.
Os que não entendem queixam-se das presenças e das ausências.
Isabel Leal(Professora de Psicologia Clínica no ISPA)
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